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sábado, 28 de setembro de 2013

Chuva

Noite amena lá fora, do lado de dentro o corpo aquecido pelo calor artificial do aquecedor e pelo calor reconfortante do chá que me habituei a tomar todos os dias antes de dormir. Do lado de fora da janela vedada por grossas tiras de borrachas num mecanismo que impede qualquer entrada de ar - e consequentemente do frio que está chegando -, ouço os trovões da chuva que desde o meio da semana a meteorologia vem anunciando.

Minha mente voltou muitos anos no tempo - pelo menos uns 15, se não mais. Me levou de volta para o tempo em que eu tinha medo da chuva. Mais do que medo da chuva, medo de trovão, raio e relâmpago. Lembro de uma cena que provavelmente nunca sairá da minha cabeça: eu, com mais ou menos 7 anos de idade, sozinha em casa, quando começou a cair uma chuva bastante violenta e eu entrei em desespero. Lembro de tudo: das paredes, do sofá, da estante de ferro, dos azulejos da cozinha; do barulho da chuva, da ausência dos meus pais e dos meus irmãos e, sobretudo, do meu choro e do meu pavor.

Hoje já não sinto mais medo da chuva; é só uma saudadinha que me invade. Nostalgia do tempo em que os meus medos se resumiam a esse tipo de coisa. Hoje os meus medos são de uma natureza diferente. Tenho medo de ficar doente em um país estranho; medo de o dinheiro não ser suficiente para pagar as contas; medo de que o professor me chame no meio da sala e eu não entenda o que ele disse.

Hoje de nada adianta ter medo da chuva. Houve um tempo em que eu poderia correr para a cama da minha mãe caso os trovões fossem muito fortes ou a energia acabasse. Mais velha, eu poderia correr para o aconchego do namorado sabendo que ouviria um "deixa de ser boba, é só uma chuva, vamos ver um filme". Não há ninguém aqui que possa ouvir meu drama exagerado. Engulo o susto, o receio, e outro gole no chá.